O que está em jogo, no caso do processo contra Jabor, não é o mérito de suas críticas ao mais do que reprovável comportamento dos deputados, a lambança que eles fazem com o meu, o seu, o nosso dinheiro. É a brutalidade mainardiana, ou reinaldo-azevediana, do protesto.
Por Luiz Weis
"No momento em que o Conselho de Ética anistiava deputados mensaleiros que foram reeleitos, dirigentes da Câmara e líderes partidários decidiram adotar duas medidas para se defenderem de críticas e cobranças: a votação de uma proposta de emenda constitucional (PEC) criando uma espécie de Advocacia Geral do Legislativo; e a abertura de um processo contra o comentarista Arnaldo Jabor, por críticas que fez à impunidade parlamentar."
A informação é da repórter Maria Lima, do Globo. Nada a respeito, estranhamente, nem na Folha, nem no Estado.
Começando pelo fim. Em comentário na rádio CBN, Jabor disse:
"Todos sabemos que os nosso queridos deputados têm direito de receber de volta o dinheiro gasto com gasolina, seja indo para seus redutos eleitorais ou indo para o hotel com suas amantes ou seus amantes. A Câmara, ou melhor, você e eu, pagamos o custo, desde que eles levem notas fiscais para comprovar os gastos da gasosa. Será que o senhor Arlindo Chinaglia não vê isso ou só continua pensando no bem do PT? Quando é que vão prender esses canalhas? Ah, esqueci, eles têm imunidade, têm foro privilegiado, é isso aí amigos otários, otários como eu."
O Brasil é um país livre. Jabor é livre para dizer o que pensa. O presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia, é livre para processá-lo por ofensa à honra. E eu sou livre para dizer que o processo vem em boa hora, assim como o que o agora ministro da Comunicação do governo, Franklin Martins, moveu contra o colunista Diego Mainardi, da Veja.
Sem civilidade
O que está em jogo, no caso do processo contra Jabor, não é o mérito de suas críticas ao mais do que reprovável comportamento dos deputados, a lambança que eles fazem com o meu, o seu, o nosso dinheiro. É a brutalidade mainardiana, ou reinaldo-azevediana, do protesto.
Situações de impunidade parlamentar estão na imprensa dia sim, o outro também. Nem por isso deveria ficar fora do alcance da Justiça a transgressão dos padrões elementares de civilidade, contida, no caso, na expressão "esses canalhas".
Indignação e palavrão rimam, mas não são sinônimos. E deve existir, sim, nas sociedades que se pretendam decentes, uma coisa chamada decoro jornalístico.
Democracia e liberdade de expressão servem para a denúncia substantiva dos malfeitos dos poderosos, onde quer que estejam, sejam eles quais forem. A razão de ser da denúncia é informar a sociedade e os órgãos de proteção dos interesses difusos, quando couber.
Já a baixaria do insulto de porta de botequim e o exercício do ódio podem fazer bem ao ego dos seus autores, mas degradam a liberdade de que todos devemos usufruir. Não melhoram a democracia - e, de quebra, não ajudam em nada a mudar o muito que precisa mudar no comportamento dos donos do poder protegidos por seus privilégios.
"Tiro no pé"
De resto, assediados, o que fazem suas excelências, os parlamentares federais? Resolvem usar dinheiro público para criar uma advocacia própria para eles, já não bastasse o maior escritório do gênero no país que também os atende, a Advocacia-Geral da União.
O projeto de emenda constitucional para isso não é novo. Foi aprovado no Senado em 2003. O que se decidiu ontem na Câmara, informa o Globo, foi acelerar a sua tramitação.
Mas não custa registrar, primeiro, que a iniciativa partiu do então senador Ney Suassuna, acusado no ano passado de fazer parte da máfia dos sanguessugas. [Ele não se reelegeu].
E, segundo, que a decisão da Câmara coincidiu não só com a anistia do Conselho de Ética a três protagonistas de escândalos na legislatura passada - como apontou a repórter Maria Lima - mas ainda com a apresentação dos projetos de decretos legislativos que aumentam os salários dos legisladores, ministros e presidente da República em 29,81% e instituem um gatilho salarial automático, vinculado aos aumentos do funcionalismo federal.
Sim, dá vontade de cobri-los todos de impropérios. Mas, quando se é jornalista, ou, não sendo, quando se tem acesso à mídia para informar e formar a opinião pública, esse tipo de reação é nefasto: um tiro no pé.
Como lembra, mais do que oportunamente a matéria do Globo, "ano passado, o diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) perdeu o emprego por causa de um texto em que chamava a CPI dos Correios de picadeiro e seus integrantes de bestas-feras".
Observatório da Imprensa
Nenhum comentário:
Postar um comentário